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Nota de Imprensa

Medida pela primeira vez a duração de um dia num exoplaneta

O VLT mede a rotação de Beta Pictoris b

30 de Abril de 2014

Com o auxílio de observações obtidas com o Very Large Telescope do ESO (VLT) conseguiu-se, pela primeira vez, determinar a taxa de rotação de um exoplaneta. Descobriu-se que Beta Pictoris b tem um dia que dura apenas 8 horas, um valor muito menor do que o observado em qualquer planeta no Sistema Solar - o equador do exoplaneta desloca-se a quase 100 000 quilómetros por hora. Este novo resultado permite estender aos exoplanetas a relação entre massa e rotação observada no Sistema Solar. Técnicas semelhantes permitirão aos astrónomos mapear exoplanetas com todo o pormenor, no futuro, utilizando o European Extremely Large Telescope (E-ELT).

O exoplaneta Beta Pictoris b orbita a estrela visível a olho nu Beta Pictoris [1], [2], que se situa a cerca de 63 anos-luz de distância da Terra na constelação austral do Pintor. Este planeta foi descoberto há quase seis anos, tendo sido um dos primeiros exoplanetas para o qual se conseguiu obter uma imagem direta. Este objeto orbita a sua estrela a uma distância que é de apenas oito vezes a distância Terra-Sol (eso1024) - o que faz com que seja o exoplaneta mais próximo da sua estrela para o qual se obteve uma imagem direta [3].

Com o auxílio do instrumento CRIRES montado no VLT, uma equipa de astrónomos holandeses da Universidade de Leiden e do Instituto Holandês de Investigação Espacial (SRON, acrónimo do holandês) descobriram que a velocidade de rotação equatorial do exoplaneta Beta Pictoris b é quase 100 000 quilómetros por hora. Comparativamente, o equador de Júpiter tem uma velocidade de cerca de 47 000 quilómetros por hora [4], enquanto o da Terra viaja a apenas 1700 quilómetros por hora [5]. Beta Pictoris b é mais de 16 vezes maior que a Terra e possui 3000 vezes mais massa que o nosso planeta, no entanto um dia neste exoplaneta dura apenas 8 horas.

“Não sabemos porque é que alguns planetas rodam mais depressa que outros,” diz o co-autor deste trabalho Remco de Kok, “mas esta primeira medição da rotação de um exoplaneta mostra que a tendência observada no Sistema Solar de que os planetas de maior massa rodam mais depressa, pode aplicar-se de igual modo aos exoplanetas, o que nos leva a pensar que este efeito deve ser alguma consequência universal do modo como os planetas se formam.”

Beta Pictoris b é um planeta muito jovem, apenas com cerca de 20 milhões de anos (comparativamente, a Terra tem 4,5 mil milhões de anos de idade) [6]. Com o passar do tempo, espera-se que o exoplaneta arrefeça e encolha, o que fará com que rode ainda mais depressa [7]. Por outro lado, outro tipo de processos podem influenciar a variação da rotação de um planeta. Por exemplo, a rotação da Terra está a diminuir com o tempo, em consequência das interações de maré com a nossa Lua.

Os astrónomos usaram uma técnica muito precisa chamada espectroscopia de alta dispersão para separar a luz nas suas cores constituintes - diferentes comprimentos de onda no espectro. O princípio do efeito Doppler (ou desvio de Doppler) permitiu que a equipa utilizasse a variação em comprimento de onda para detectar que as diferentes partes do planeta se estavam a mover a velocidades diferentes e em direções opostas relativamente ao observador. Retirando cuidadosamente os efeitos da estrela progenitora, muito mais brilhante, conseguiram extrair o sinal correspondente à rotação do planeta.

“Medimos os comprimentos de onda da radiação emitida pelo planeta com uma precisão de um sobre cem mil, o que faz com que as medições sejam sensíveis aos efeitos Doppler que nos revelam a velocidade dos objetos emissores,” diz o autor principal Ignas Snellen. “Usando esta técnica descobrimos que as diferentes partes da superfície do planeta se deslocam na nossa direção ou na direção oposta a velocidades diferentes, o que só pode significar que o planeta roda em torno do seu eixo.”

Esta técnica está relacionada com a técnica de obtenção de imagens Doppler, usada já há várias décadas para mapear a superfície das estrelas e, recentemente, a de uma anã castanha [8] - Luhman 16B (eso1404). A rápida rotação de Beta Pictoris b significa que no futuro será possível fazer um mapa global do planeta, mostrando possíveis padrões de nuvens e tempestades enormes.

“Esta técnica pode ser utilizada numa amostra muito maior de exoplanetas com a excelente resolução e sensibilidade que terá o E-ELT e um espectrógrafo de imagem de alta dispersão. Com o instrumento METIS (Mid-infrared E-ELT Imager and Spectrograph) que está a ser planeado, seremos capazes de fazer mapas globais de exoplanetas e caracterizar planetas muito mais pequenos do que Beta Pictoris b”, diz  o Investigador Principal do METIS e co-autor do novo artigo científico que descreve estes resultados, Bernhard Brandl.

Notas

[1] Beta Pictoris tem muitos outros nomes, por exemplo HD 39060, SAO 234134 e HIP 27321.

[2] Beta Pictoris é um dos melhores exemplos de uma estrela rodeada por um disco de restos de matéria e poeira. Sabe-se que este disco tem uma extensão de cerca de 1000 vezes a distância entre a Terra e o Sol. Observações anteriores do planeta de Beta Pictoris foram anunciadas nas notas de imprensa eso0842, eso1024 e eso1408.

[3] As observações usam a técnica de óptica adaptativa, que compensa os efeitos de turbulência da atmosfera terrestre. Este efeito faz com que as imagens obtidas, mesmo nos melhores locais de observação da Terra, fiquem distorcidas. Esta técnica permite obter imagens extremamente nítidas, quase tão boas como as que se obtêm no espaço.

[4] Uma vez que Júpiter não tem uma superfície sólida a partir da qual se possa determinar a taxa de rotação do planeta, tomamos a velocidade de rotação da sua atmosfera equatorial, que é 47 000 quilómetros por hora.

 [5] A velocidade de rotação da Terra no equador é de 1674,4 quilómetros por hora.

[6] Medições anteriores sugeriam que o sistema era mais novo.

[7] Este facto é uma consequência direta da conservação do momento angular e trata-se do mesmo fenómeno que faz com que uma bailarina de patinagem no gelo rode mais depressa sobre si mesma quando junta os braços ao corpo.

[8] As anãs castanhas são muitas vezes chamadas “estrelas falhadas” uma vez que, ao contrário de estrelas como o Sol, nunca conseguem tornar-se suficientemente quentes para darem início a reações de fusão nuclear.

Informações adicionais

Este trabalho foi descrito num artigo científico “Fast spin of a young extrasolar planet”, de I. Snellen et al., que será publicado na revista Nature a 1 de maio de 2014.

A equipa é composta por Ignas A. G. Snellen (Observatório de Leiden, Universidade de Leiden, Leiden, Holanda), Bernhard Brandl (Observatório de Leiden), Remco J. de Kok (Observatório de Leiden, SRON -  Instituto Holandês de Investigação Espacial, Utrecht, Holanda), Matteo Brogi (Observatório de Leiden), Jayne Birkby (Observatório de Leiden) e Henriette Schwarz (Observatório de Leiden).

O ESO é a mais importante organização europeia intergovernamental para a investigação em astronomia e é o observatório astronómico mais produtivo do mundo. O ESO é  financiado por 15 países: Alemanha, Áustria, Bélgica, Brasil, Dinamarca, Espanha, Finlândia, França, Holanda, Itália, Portugal, Reino Unido, República Checa, Suécia e Suíça. O ESO destaca-se por levar a cabo um programa de trabalhos ambicioso, focado na concepção, construção e funcionamento de observatórios astronómicos terrestres de ponta, que possibilitam aos astrónomos importantes descobertas científicas. O ESO também tem um papel importante na promoção e organização de cooperação na investigação astronómica. O ESO mantém em funcionamento três observatórios de ponta, no Chile: La Silla, Paranal e Chajnantor. No Paranal, o ESO opera  o Very Large Telescope, o observatório astronómico óptico mais avançado do mundo e dois telescópios de rastreio. O VISTA, o maior telescópio de rastreio do mundo que trabalha no infravermelho e o VLT Survey Telescope, o maior telescópio concebido exclusivamente para mapear os céus no visível. O ESO é o parceiro europeu do revolucionário telescópio  ALMA, o maior projeto astronómico que existe atualmente. O ESO encontra-se a planear o European Extremely Large Telescope, E-ELT, um telescópio de 39 metros que observará na banda do visível e do infravermelho próximo. O E-ELT será “o maior olho do mundo virado para o céu”.

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Este texto é a tradução da Nota de Imprensa do ESO eso1414, cortesia do ESON, uma rede de pessoas nos Países Membros do ESO, que servem como pontos de contacto local com os meios de comunicação social, em ligação com os desenvolvimentos do ESO. A representante do nodo português é Margarida Serote.

Sobre a Nota de Imprensa

Nº da Notícia:eso1414pt
Nome:Beta Pictoris
Tipo:Milky Way : Star : Circumstellar Material : Planetary System
Facility:Very Large Telescope
Instrumentos:CRIRES
Science data:2014Natur.509...63S

Imagens

Impressão artística do planeta Beta Pictoris b
Impressão artística do planeta Beta Pictoris b
A relação universal entre a massa e a velocidade de rotação dos planetas
A relação universal entre a massa e a velocidade de rotação dos planetas
Mapa do céu em torno de Beta Pictoris
Mapa do céu em torno de Beta Pictoris
Em torno de Beta Pictoris
Em torno de Beta Pictoris

Vídeos

Zoom em direção a Beta Pictoris b
Zoom em direção a Beta Pictoris b