Nota de Imprensa

Um Par de Anãs Castanhas Muito Frias

23 de Março de 2011

Observações obtidas com o Very Large Telescope do Observatório Europeu do Sul em conjunto com mais dois telescópios mostram que existe um novo candidato para a estrela mais fria conhecida: uma anã castanha num sistema duplo com aproximadamente a mesma temperatura que uma chávena de chá acabado de fazer - quente em termos humanos, mas extraordinariamente frio para a superfície de uma estrela. Este objeto é suficientemente frio para começar a atravessar a linha ténue que separa as estrelas pequenas frias dos planetas grandes quentes.

As anãs castanhas são essencialmente estrelas falhadas:  não possuem massa em quantidade suficiente para que a gravidade dê origem às reações nucleares que fazem as estrelas brilhar. A anã castanha agora descoberta, identificada como CFBDSIR 1458+10B, é o membro mais ténue de um sistema binário de anãs castanhas situado a apenas 75 anos-luz da Terra [1].

O poderoso espectrógrafo X-shooter montado no Very Large Telescope do ESO (VLT) foi utilizado para mostrar que o objeto composto era muito frio quando comparado com anãs castanhas típicas. “ Ficámos muito entusiasmados ao descobrir que este objeto tinha uma temperatura tão baixa, mas estávamos longe de imaginar que era um sistema duplo e que possuía uma componente ainda mais fria, tornando-o assim ainda mais interessante,” diz Philippe Delorme do Institut de Planétologie et d´Astrophysique de Grenoble (CNRS/Université Joseh Fourier), co-autor do artigo científico que relata estes novos resultados. CFBDSIR 1458+10 é o binário de anãs castanhas mais frio encontrado até hoje.

Descobriu-se agora que a mais ténue das duas anãs castanhas tem uma temperatura de cerca de 100º Celsius - o ponto de ebulição da água,  não muito diferente da temperatura dentro de uma sauna [2]. “A tais temperaturas esperamos que a anã castanha tenha propriedades que são diferentes das anãs castanhas conhecidas e mais próximas das de exoplanetas gigantes - poderia inclusivamente possuir nuvens de água na sua atmosfera,” diz o autor principal do artigo, Michael Liu do Instituto de Astronomia da Universidade do Hawaii. “De facto, assim que começarmos a obter, num futuro próximo, imagens de planetas gasosos gigantes em torno de estrelas semelhantes ao Sol, penso que muitos deles se parecerão com CFBDSIR 1458+10B”.
 
Para desvendar os segredos deste objeto tão invulgar foi necessário combinar observações obtidas por três telescópios diferentes. Descobriu-se inicialmente que CFBDSIR 1458+10 era um binário utilizando o sistema de Estrela Guia Laser de Óptica Adaptativa do Telescópio Keck II, situado no Hawaii [3]. Liu e colegas utilizaram seguidamente o Telescópio Canada-France-Hawaii, também situado no Hawaii, para determinar a distância ao duo de anãs castanhas utilizando uma câmara infravermelha [4]. Finalmente, o VLT do ESO foi utilizado para estudar o espectro infravermelho do objeto e medir a sua temperatura.

A busca de objetos frios é um tópico astronómico muito quente. O Telescópio Espacial Spitzer identificou recentemente dois outros objetos muito ténues como possíveis candidatos às anãs castanhas mais frias conhecidas, embora as suas temperaturas não tenham sido medidas com tanta precisão. Observações futuras determinarão melhor como é que estes objetos se comparam a CFBDSIR 1458+10B.  Liu e colegas estão a planear novas observações de CFBDSIR 1458+10B para determinar melhor as suas propriedades e começar a mapear a órbita do binário a qual, depois de uma década de monitorização, deverá permitir aos astrónomos determinar a massa do binário.

Notas

[1] CFBDSIR 1458+10 é o nome do sistema binário. As duas componentes são conhecidas como CFBDSIR 1458+10A e CFBDSIR 1458+10B, sendo esta última a mais ténue e fria das duas. Parecem orbitar em torno uma da outra com uma separação de cerca de três vezes a distância entre a Terra e o Sol e um período de cerca de trinta anos.

[2] Para comparação a temperatura à superfície de Sol é cerca de 5500º Celsius.

[3] A óptica adaptativa cancela a maior parte da interferência atmosférica da Terra, melhorando a nitidez das imagens de cerca de um factor dez, permitindo assim resolver a separação muito pequena do binário.

[4] Os astrónomos mediram o movimento aparente das anãs castanhas, relativamente ao campo de fundo de estrelas mais distantes, causado pela mudança de posição da Terra na sua órbita em torno do Sol. O efeito, conhecido por paralaxe, permitiu-lhes determinar a distância às anãs castanhas.

Informações adicionais

Este trabalho foi apresentado num artigo científico que sairá na revista da especialidade
Astrophysical Journal, “CFBDSIR J1458+1013B: A Very Cold (>T10) Brown Dwarf in a Binary System”, Liu et al.

A equipa é composta por Michael C. Liu (Institute for Astronomy [IfA], University of Hawaii, USA), Philippe Delorme (Institut de planétologie et d’astrophysique de Grenoble, CNRS/Université Joseph Fourier, France [IPAG]), Trent J. Dupuy (Harvard-Smithsonian Center for Astrophysics, Cambridge, USA), Brendan P. Bowler (IfA), Loic Albert (Canada-France-Hawaii Telescope Corporation, Hawaii, USA), Etienne Artigau (Université de Montréal, Canada), Celine Reylé (Observatoire de Besançon, France), Thierry Forveille (IPAG) e Xavier Delfosse (IPAG).

O ESO, o Observatório Europeu do Sul, é a mais importante organização europeia intergovernamental para a investigação em astronomia e é o observatório astronómico mais produtivo do mundo. O ESO é  financiado por 15 países: Áustria, Alemanha, Bélgica, Brasil, Dinamarca, Espanha, Finlândia, França, Itália, Holanda, Portugal, Reino Unido, República Checa, Suécia e Suíça. O ESO destaca-se por levar a cabo um programa de trabalhos ambicioso, focado na concepção, construção e funcionamento de observatórios astronómicos terrestres de ponta, que possibilitam aos astrónomos importantes descobertas científicas. O ESO também tem um papel importante na promoção e organização de cooperação na investigação astronómica. O ESO mantém em funcionamento três observatórios de ponta, no Chile: La Silla, Paranal e Chajnantor. No Paranal, o ESO opera  o Very Large Telescope, o observatório astronómico, no visível, mais avançado do mundo e o VISTA, o maior telescópio de rastreio do mundo. O ESO é o parceiro europeu do revolucionário telescópio  ALMA, o maior projeto astronómico que existe atualmente. O ESO encontra-se a planear o European Extremely Large Telescope, E-ELT, um telescópio de 42 metros que observará na banda do visível e próximo infravermelho. O E-ELT será “o maior olho no céu do mundo”.

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Este texto é a tradução da Nota de Imprensa do ESO eso1110, cortesia do ESON, uma rede de pessoas nos Países Membros do ESO, que servem como pontos de contacto local com os meios de comunicação social, em ligação com os desenvolvimentos do ESO. A representante do nodo português é Margarida Serote.

Sobre a Nota de Imprensa

Nº da Notícia:eso1110pt
Nome:CFBDSIR 1458+10
Tipo:Milky Way : Star : Type : Brown Dwarf
Facility:CFHT, New Technology Telescope, Very Large Telescope, W. M. Keck Observatory
Instrumentos:SOFI, X-shooter
Science data:2011ApJ...740..108L

Imagens

The coolest pair of brown dwarfs
The coolest pair of brown dwarfs
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The brown dwarf binary CFBDSIR 1458+10
The brown dwarf binary CFBDSIR 1458+10
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Wide-field view of the sky around the brown dwarf binary CFBDSIR 1458+10
Wide-field view of the sky around the brown dwarf binary CFBDSIR 1458+10
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Vídeos

Zooming in on the brown dwarf binary CFBDSIR 1458+10
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