Nota de Imprensa

Telescópios do ESO ajudam a desvendar puzzle dos pulsares

30 de Agosto de 2023

Por meio de uma campanha de observação que envolveu 12 telescópios no solo e no espaço, incluindo três infraestruturas do Observatório Europeu do Sul (ESO), os astrónomos investigaram o estranho comportamento de um pulsar, uma estrela morta com rotação extremamente rápida. Este objeto misterioso é conhecido por alternar entre dois modos de brilho quase constantemente, algo que até à data tem sido um enigma. Os astrónomos descobriram agora que as súbitas ejeções de matéria, lançadas pelo pulsar em períodos muito curtos, são responsáveis por estas mudanças peculiares.

"Acabámos de observar eventos cósmicos extraordinários, onde enormes quantidades de matéria, semelhantes a balas de canhão cósmicas, são lançadas para o espaço num espaço de tempo muito curto (da ordem das dezenas de segundos), por um objeto celeste pequeno e denso que gira a velocidades extremamente elevadas", afirma Maria Cristina Baglio, investigadora da Universidade New York de Abu Dhabi, afiliada ao Instituto Nacional de Astrofísica Italiano (INAF), e co-autora principal do artigo científico que descreve este resultado, publicado hoje na revista da especialidade Astronomy & Astrophysics.

Um pulsar, ou estrela de neutrões, trata-se de uma estrela morta, magnética e de rotação rápida, que emite um feixe de radiação electromagnética para o espaço. À medida que roda, este feixe varre o cosmos — tal como um farol que varre o seu espaço circundante — e é detectado pelos astrónomos quando intercepta a linha de visão da Terra. Este efeito faz com que a estrela pareça pulsar em brilho quando observada a partir do nosso planeta.

PSR J1023+0038 (ou J1023 para abreviar) é um tipo especial de pulsar que apresenta um comportamento estranho. Localizado a cerca de 4500 anos-luz de distância da Terra, na constelação do Sextante, orbita próximo de outra estrela. Durante a última década, o pulsar tem estado ativamente a retirar matéria dessa companheira, matéria esta que se acumula num disco à volta do pulsar e vai caindo lentamente na sua direção.

Desde que este processo de acumulação de matéria começou, o feixe de varrimento praticamente que desapareceu e o pulsar começou a alternar incessantemente entre dois modos. No modo "alto", o pulsar emite raios X brilhantes, ultravioleta e luz visível, enquanto no modo "baixo" se torna mais fraco para estas frequências mas emite mais nas ondas rádio. O pulsar pode permanecer em cada modo durante vários segundos ou minutos, mudando depois para o outro modo em apenas alguns segundos. Até agora, esta mudança tem intrigado os astrónomos.

"A nossa campanha de observação sem precedentes concebida para compreender o comportamento deste pulsar, envolveu uma dúzia de telescópios terrestres e espaciais de vanguarda", diz Francesco Coti Zelati, investigador do Instituto de Ciências do Espaço, em Barcelona, Espanha, e co-autor principal do artigo científico. A campanha incluiu o Very Large Telescope (VLT) e o New Technology Telescope (NTT), ambos do ESO, que detectaram radiação visível e infravermelha próxima, bem como o Atacama Large Millimeter/submillimeter Array (ALMA), do qual o ESO é um parceiro. Durante duas noites em Junho de 2021, os astrónomos observaram o sistema a efetuar mais de 280 mudanças entre os seus modos alto e baixo.

"Descobrimos que a mudança de modo resulta de uma intrincada interação entre o vento do pulsar — um fluxo de partículas de alta energia que se afasta do pulsar — e a matéria que flui em direção ao pulsar", diz Coti Zelati, afiliado também ao INAF.

No modo baixo, a matéria que flui em direção ao pulsar é expelida num jato estreito perpendicular ao disco. Gradualmente, esta matéria acumula-se cada vez mais perto do pulsar e começa a ser atingida pelo vento que sopra da estrela pulsante, o que dá origem ao aquecimento da matéria. O sistema fica então no modo alto, brilhando intensamente em raios-X, ultravioleta e luz visível. Eventualmente, bolhas desta matéria quente são removidas pelo pulsar através do jato. Com menos matéria quente no disco, o sistema brilha menos, mudando de novo para o modo baixo.

Apesar desta descoberta ter desvendado o mistério do estranho comportamento de J1023, os astrónomos ainda têm muito a aprender com o estudo deste sistema único e os telescópios do ESO continuarão a auxiliar os astrónomos na observação deste pulsar bastante peculiar. Em particular, o Extremely Large Telescope (ELT) do ESO, atualmente em construção no Chile, oferecerá uma visão sem precedentes dos mecanismos de comutação do J1023. “O ELT permitir-nos-á obter informações essenciais sobre a forma como a abundância, a distribuição, a dinâmica e a energia da matéria que flui em torno do pulsar são afectadas pela comutação de modos", conclui Sergio Campana, Diretor de Investigação do Observatório de Brera, INAF, e co-autor do estudo.

Informações adicionais

Este trabalho de investigação foi descrito num artigo científico publicado na revista da especialidade Astronomy & Astrophysics (doi:10.1051/0004-6361/202346418).

A equipa é composta por: M. C. Baglio (Centro de Astro, Partículas e Física Planetária, Universidade New York de Abu Dhabi, Emiratos Árabes Unidos [NYU Abu Dhabi]; INAF – Osservatorio Astronomico di Brera, Merate, Itália [INAF Brera]), F. Coti Zelati (Instituto de Ciências do Espaço, Campus UAB, Barcelona, Espanha [ICE–CSIC]; Institut d’Estudis Espacials de Catalunya (IEEC), Barcelona, Espanha [IEEC]; INAF Brera), S. Campana (INAF Brera), G. Busquet (Departament de Física Quànticai Astrofísica, Universitat de Barcelona, Espanha; Institut de Ciències del Cosmos, Universitat de Barcelona, Espanha; IEEC), P. D’Avanzo (INAF Brera), S. Giarratana (INAF – Istituto di Radioastronomia, Bologna, Itália [INAF Bologna]; Departamento de Física e Astronomia, Universidade de Bologna, Itália [Bologna]), M. Giroletti (INAF Bologna; Bologna), F. Ambrosino (INAF – Osservatorio Astronomico di Roma, Roma, Itália [INAF Roma]); INAF – Istituto Astrofisica Planetologia Spaziali, Roma, Itália; Sapienza Università di Roma, Roma, Itália), S.Crespi (NYU Abu Dhabi), A. Miraval Zanon (Agenzia Spaziale Italiana, Roma, Itália; INAF Roma), X. Hou (Observatórios Yunnan, Academia Chinesa de Ciências, Kunming, China; Laboratório Chave de Estrutura e Evolução de Objetos Celestes, Academia Chinesa de Ciências, Kunming, China), D. Li (Observatórios Astronómicos Nacionais, Academia Chinesa de Ciências, Beijing, China; Universidade da Academia Chinesa de Ciências, Beijing, China; Centro de Investigação de Plataformas Informáticas Inteligentes, Laboratório Zhejiang, Hangzhou, China), J. Li (Laboratório Chave CAS de Investigação de Galáxias e Cosmologia, Departamento de Astronomia, Universidade de Ciências e Tecnologia da China, Hefei, China; Escola de Astronomia e Ciências do Espaço, Universidade de Ciências e Tecnologia da China, Hefei, China), P. Wang (Instituto das Fronteiras em Astronomia e Astrofísica, Universidade Normal de Beijing, Beijing, China), D. M. Russell (NYU Abu Dhabi), D. F. Torres (INAF Brera; IEEC; Institució Catalana de Recercai Estudis Avançats, Barcelona, Espanha), K. Alabarta (NYU Abu Dhabi), P. Casella (INAF Roma), S. Covino (INAF Brera), D. M. Bramich (NYU Abu Dhabi; Divisão de Engenharia, Universidade New York  de Abu Dhabi, Emiratos Árabes Unidos), D. de Martino (INAF − Osservatorio Astronomico di Capodimonte, Napoli, Itália), M. Méndez (Instituto Astronómico Kapteyn, Universidade de Groningen, Groningen, Países Baixos), S. E. Motta (INAF Brera), A. Papitto (INAF Roma), P. Saikia (NYU Abu Dhabi) e F. Vincentelli (Instituto de Astrofísica de Canarias, Tenerife, Espanha; Departamento de Astrofísica, Universidad de La Laguna, Tenerife, Espanha).

O Observatório Europeu do Sul (ESO) ajuda cientistas de todo o mundo a descobrir os segredos do Universo, o que, consequentemente, beneficia toda a sociedade. No ESO concebemos, construimos e operamos observatórios terrestres de vanguarda — os quais são usados pelos astrónomos para investigar as maiores questões astronómicas da nossa época e levar ao público o fascínio da astronomia — e promovemos colaborações internacionais em astronomia. Estabelecido como uma organização intergovernamental em 1962, o ESO é hoje apoiado por 16 Estados Membros (Alemanha, Áustria, Bélgica, Dinamarca, Espanha, Finlândia, França, Irlanda, Itália, Países Baixos, Polónia, Portugal, Reino Unido, República Checa, Suécia e Suíça), para além do Chile, o país de acolhimento, e da Austrália como Parceiro Estratégico. A Sede do ESO e o seu centro de visitantes e planetário, o Supernova do ESO, situam-se perto de Munique, na Alemanha, enquanto o deserto chileno do Atacama, um lugar extraordinário com condições únicas para a observação dos céus, acolhe os nossos telescópios. O ESO mantém em funcionamento três observatórios: La Silla, Paranal e Chajnantor. No Paranal, o ESO opera o Very Large Telescope e o Interferómetro do Very Large Telescope, assim como telescópios de rastreio, tal como o VISTA. Ainda no Paranal, o ESO acolherá e operará o Cherenkov Telescope Array South, o maior e mais sensível observatório de raios gama do mundo. Juntamente com parceiros internacionais, o ESO opera o APEX e o ALMA no Chajnantor, duas infraestruturas que observam o céu no domínio do milímetro e do submilímetro. No Cerro Armazones, próximo do Paranal, estamos a construir “o maior olho do mundo voltado para o céu” — o Extremely Large Telescope do ESO. Dos nossos gabinetes em Santiago do Chile, apoiamos as nossas operações no país e trabalhamos com parceiros chilenos e com a sociedade chilena.

O Atacama Large Millimeter/submillimeter Array (ALMA), uma infraestrutura astronómica internacional, surge no âmbito de uma parceria entre o ESO, a Fundação Nacional de Ciências dos Estados Unidos (NSF) e os Institutos Nacionais de Ciências da Natureza (NINS) do Japão, em cooperação com a República do Chile. O ALMA é financiado pelo ESO em prol dos seus Estados Membros, pela NSF em cooperação com o Conselho de Investigação Nacional do Canadá (NRC) e o Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia da Taiwan e pelo NINS em cooperação com a Academia Sinica (AS) da Taiwan e o Instituto de Astronomia e Ciências do Espaço da Coreia (KASI). A construção e operação do ALMA é coordenada pelo ESO, em prol dos seus Estados Membros; pelo Observatório Nacional de Rádio Astronomia dos Estados Unidos (NRAO), que é gerido pela Associação de Universidades, Inc. (AUI), em prol da América do Norte; e pelo Observatório Astronómico Nacional do Japão (NAOJ), em prol do Leste Asiático. O Observatório Conjunto ALMA (JAO) fornece uma liderança e gestão unificadas na construção, comissionamento e operação do ALMA.

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Maria Cristina Baglio
New York University Abu Dhabi and Italian National Institute for Astrophysics (INAF)
Abu Dhabi, United Arab Emirates
Tel.: +97126287089
Email: mcb19@nyu.edu ; maria.baglio@inaf.it

Francesco Coti Zelati
Institute of Space Sciences
Barcelona, Spain
Tel.: (+34) 937379788 430416
Email: cotizelati@ice.csic.es

Sergio Campana
INAF Brera Observatory
Merate, Italy
Tel.: +39 02 72320418
Email: sergio.campana@brera.inaf.it

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Este texto é a tradução da Nota de Imprensa do ESO eso2315, cortesia do ESON, uma rede de pessoas nos Países Membros do ESO, que servem como pontos de contacto local com os meios de comunicação social, em ligação com os desenvolvimentos do ESO. A representante do nodo português é Margarida Serote.

Sobre a Nota de Imprensa

Nº da Notícia:eso2315pt
Nome:PSR J1023+0038
Tipo:Milky Way : Star : Evolutionary Stage : Neutron Star : Pulsar
Facility:Atacama Large Millimeter/submillimeter Array, New Technology Telescope, Very Large Telescope
Science data:2023A&A...677A..30B

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Imagem artística do pulsar PSR J1023+0038
Imagem artística do pulsar PSR J1023+0038

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Telescópios do ESO ajudam a desvendar puzzle dos pulsares (ESOcast 266 Light)
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Animação artística do pulsar PSR J1023+0038
Animação artística do pulsar PSR J1023+0038